Dia desses, mudei o caminho de volta para casa. Não porque
ele ficaria mais curto ou mais rápido, mas porque seria diferente. A urgência em fazer algo que não trouxesse lembranças ou qualquer outro sentimento prévio
veio no ir e vir de dias e semanas em que a única coisa que se quer é que algo
mude (para melhor, por favor). E foi justamente assim, em um ambiente ainda
pouco familiar, que vi nas ruas o boné usado de uma forma que eu só havia visto
na cabeça do Neymar e de tantos outros jogadores de futebol: suspenso na
cabeça, criando um volume extra, como quase que não querendo estar ali. E eram
tantos os meninos com o mesmo estilo que acabei me lembrando do João.
Reprodução/Instagram |
O João
era um garoto bem alto, magro e que amava jogar basquete lá pelos anos 1995.
Estudávamos na mesma escola, e eu era apaixonada por ele e pela cor que seu
rosto ganhava após horas de jogos infinitos. Sem nunca ter ouvido a voz do
João, eu admirei primeiro a maneira simples com que ele se vestia. Era sempre calça
jeans e camisetas lisas, principalmente as brancas e pretas. Ele combinava tudo
de uma maneira de a calça estar sempre quase caindo, embora segura por um
cinto. Nos pés, ele tinha tênis próprios para as muitas horas que ele passava
nas quadras de esporte – ele parecia matar todas as aulas para comparecer a
todas as de educação fisíca do colégio. Fechando o visual, que me parecia
de um bom gosto incrível, ele usava um boné, virado com a aba para trás. Nem
preciso dizer que achava aquilo tudo lindo. Acho que foi ali que entendi que
não era o dinheiro, muito menos a noção de estilo, que fazia de um homem
(menino) um cara interessante. Ele era interessante. Ah, a camiseta branca do
João nunca saiu da minha cabeça, assim como a maneira que ele usava o boné.
Hoje, por aqueles meninos do boné à la Neymar, ele seria visto como um ponto
fora da curva, um sujeito por fora do que é legal. Nessa viagem toda, pensei
nas mudanças. A primeira delas é que atualmente acho terrível o uso de boné,
não há desculpa fashion que alivie um crime desses. A segunda, que o legal
parece ser mesmo usar o acessório de maneira que ele não tenha quase que sua
função original, que é ficar ali, plantadinho na cabeça, e não com jeitão de querer
sair voando por aí. A terceira, bem, essa é sobre a mudança em si. Uma só
alteração no caminho de voltar para casa é capaz de trazer encontros
inesperados com bonés suspensos e memórias que já pareciam esquecidas. Se a maneira
de usar o boné mudou, imagine todo o resto. Só para constar: o João deixou a
escola após todo mundo ficar sabendo que a namorada dele havia ficado grávida.
Nunca mais se ouviu falar dele, muito menos ele foi visto por aí. Mais uma daquelas
mudanças e tanto da vida que deixam qualquer alteração no modo de usar o boné
no chinelo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário